Após falas polêmicas Meneguelli dificulta candidatura ao Senado

Após falas polêmicas Meneguelli dificulta candidatura ao Senado

Sérgio Meneguelli: “Eu não tenho nada de conservador”. Em entrevista franca e explosiva, pré-candidato ao Senado mostra que tem muito pouco em comum com o próprio partido (o Republicanos), nega ser bolsonarista, critica “a bancada evangélica” e até o bispo Crivella. Também explica o que tem de liberal, rechaça a “ilusão” de que pode sair do páreo e opina sobre aborto, maconha e casamento gay. Ainda sobram alfinetadas em Magno Malta

Eu não tenho nada de conservador”, avisa logo Sérgio Meneguelli a este entrevistador. Pré-candidato ao Senado pelo Republicanos, o ex-prefeito de Colatina concedeu à coluna, na última sexta-feira (10), uma entrevista bem ao seu estilo – extremamente franca –, a qual, no seu conjunto, leva a uma conclusão inevitável: o pensamento político de Meneguelli não tem absolutamente nada a ver com o do partido pelo qual ele pretende chegar ao Senado. Não só o pensamento político. A visão de mundo do ex-prefeito difere muito daquela mantida pelos bispos e pastores que controlam o partido de orientação notoriamente conservadora e evangélica

O próprio Meneguelli reconhece isso, aliás. Ele chega a criticar o comportamento de uma das eminências do Republicanos, o ex-prefeito do Rio e bispo da Igreja Universal do Reino de Deus Marcelo Crivella. E considera que sua visão é diferente daquela do partido: “Em muitas coisas, [é diferente] sim. Eu acho que o Crivella foi mais um pastor do que um prefeito. Então não, eu vou ser prefeito, vou ser político. Eu não vou ter mandato com religião”

Citando espontaneamente (três vezes!) que o Estado brasileiro é laico, Meneguelli afirma que não fará parte do Centrão (o Republicanos faz) e que não pertencerá a bancadas temáticas, muito menos da religiosa ou evangélica (parlamentares do Republicanos estão em peso na “bancada da Bíblia” no Congresso). E vai além, criticando a atuação de tais bancadas: “O Estado é laico. Como é que vai ter uma bancada evangélica onde o Estado é laico? […] Como é que vou participar de uma bancada religiosa? Eu sou contra essas nominações, sabe? A função de todos lá é a mesma: representar o povo brasileiro, não importa se ele é católico, se é crente, se é ateu ou não”.

O ex-prefeito estende a sua crítica para a multiplicação de igrejas cristãs no país: “[…] Por exemplo, ‘bancada evangélica’: está dividindo o cristianismo. Hoje acho que temos mais de mil religiões no país. Isso só divide o cristianismo”.

Declarando-se católico, ele diz que não usará o nome de Deus em sua campanha ao Senado (mas eminências do Republicanos fazem isso o tempo todo): “Não vou ficar invocando o nome de Deus em vão para dar uma de bonzinho”.

Mantendo críticas ao governo Bolsonaro, como à política ambiental e à negação em face da pandemia, Meneguelli também afirma que não é um bolsonarista (de novo: ao contrário do próprio partido, apoiador do atual presidente): “Eu sou um crítico. Então tem coisas que eu concordo com Bolsonaro como tem coisas que eu não concordo. […] Tenho personalidade política própria”. Ele ressalta, contudo, que seguirá a orientação do partido de votar no atual presidente.

O pré-candidato diz “fugir da bola dividida de direita e de esquerda”, se diz contra toda forma de radicalismo e avalia que essa divisão exacerbada está prejudicando o país. Instado a se definir ideologicamente, cunha um conceito no mínimo insólito: “Se pode existir, eu sou um conservador super liberal”.

Ele explica: “Eu gosto de conservar os bons costumes, mas dentro da modernidade, com avanço, com liberdade. Toda pessoa conservadora demais passa a ser radical. E uma pessoa radical é igual a um burro: tem aquela viseira, só vê o que está na frente, não vê de lado. […] Então eu acho que sou um conservador moderno: conservo o bom, mas estou com a cabeça pronta para receber o novo.”

Reconhecendo-se muito mais no jeito de ser do carioca, Meneguelli entende que ser “liberal” é “aceitar outras opiniões, é aceitar outras coisas, é aceitar o novo”. E enxerga-se como um liberal “no jeito de ver a vida, de entender, da convivência, de respeitar o próximo, a empatia…”

Essa mentalidade mais liberal se aplica, na prática, a alguns temas polêmicos ligados à agenda de costumes que o ex-prefeito possivelmente terá de enfrentar se for eleito senador. Acerca da descriminalização da maconha, ele mostra-se aberto ao debate (interditado no Republicanos): “Quando se fala da legalização da maconha ou do aborto ou de qualquer outra coisa, tem que haver debate, tem que se ver a forma como é. […] A maconha pode ser liberada de uma forma que seja prejudicial, mas pode ser liberada de uma forma que pode até trazer divisas”.

Quanto ao aborto propriamente dito (tabu no Republicanos), ele, como cristão, declara-se contra a prática, mas observa que as mulheres precisam ser mais ouvidas nessa discussão.

Com relação à união homoafetiva (intolerável e inadmissível para líderes do Republicanos), ele afirma não ver problema algum e chega a citar letra de Caetano Veloso: “‘Cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é’. Se a pessoa for feliz naquele casamento, que ela seja feliz. Não tenho que opinar sobre como aquela pessoa quer viver. […] Direitos reconhecidos acho que qualquer sociedade deve ter. […] Cada um tem o direito de ser o que quer ser. Isso para mim é uma coisa tão assim… Eu não sei nem por que se entra nesses debates, porque a própria sociedade vai conquistando isso”.

De Caetano a Marilyn Monroe, Meneguelli cita outra referência cultural, o filme “O Inimigo Mora ao Lado” (na verdade, “O Pecado Mora ao Lado”), para rechaçar especulações de que sua candidatura possa ser sacrificada num acordo do PL de Bolsonaro com o Republicanos para favorecer o ex-senador Magno Malta, seu concorrente direto nessa disputa ao Senado pelo Espírito Santo:

Isso é ilusão de adversários fracos que tentam plantar isso para desestabilizar. Nós estamos firmes e fortes. E não tem isso. Eu vou ser candidato a senador. Eu não abro mão. […] Por que eu abriria mão para dar oportunidade a um baiano que já foi senador deste Estado por 16 anos? […] Seria uma aberração.”

Ainda sobram algumas críticas ao próprio Magno: “Tenho um pensamento diferente do Magno Malta e um modo diferente de fazer política. […] Primeiro que eu não fico atrás de mitos. […] E ele está nadando na onda de Bolsonaro, de extremistas”.

Tudo isso e muito mais você confere na entrevista completa do “conservador super liberal”, a partir de agora:

Por que o senhor quer ser senador pelo Espírito Santo?

Porque vejo que, neste momento, o Espírito Santo está precisando de uma representação forte no Senado, que faça a diferença. O último senador eleito pelo Norte do Estado foi Moacyr Dalla, em 1978. Camata foi senador [eleito em 1986, 1994 e 2002], mas ele só nasceu em Marilândia.

O senhor inclusive trabalhou para Moacyr Dalla, certo?

Eu era faxineiro dele. Trabalhava no quintal dele, depois fui trabalhar no cartório dele, como faxineiro. Mas ele me conheceu no palanque. Desde pequeno eu falava, fazia discursos. Fiz meu primeiro discurso aos 13 anos de idade. Fiquei mais de três anos como faxineiro no cartório dele. Fui criando uma ligação com ele ao longo do tempo, tipo um empregado próximo à família. Mas nunca deixei de ser empregado dele.

E o fato é que, desde 1978, o Norte do Espírito Santo não elege um senador?

Sim. Outra coisa que me motiva é fazer uma representação no Senado que destaque o Espírito Santo. Acho que isso é possível, não importa o tamanho do Estado. Por exemplo, Colatina não é a maior cidade capixaba. Mas você vê que, com a nossa administração, a gente conseguiu dar uma repercussão ao nome de Colatina em todo o território nacional. Isso eu vejo pelas correspondências, pelas matérias, pelos convites. E acho que o Senado precisa se aproximar mais do povo. Hoje vejo os nossos congressistas lutando só por emendas. Emenda é ótimo, mas já é algo a que os estados e municípios têm direito. Não acho certo usar isso como trampolim. Na verdade, o que a Constituição nos faculta é fiscalizar e legislar. Então quero ser um autêntico senador do Espírito Santo.

E quais serão as suas principais bandeiras no Senado? O senhor pretende focar o seu mandato em alguma área, algum tema específico?

Pretendo participar de todos os debates lá, mas de uma forma que a gente não seja Maria vai com as outras nem pau mandado. Não vou fazer um mandato temático. Acho que essa divisão não é tão democrática. Ninguém vai para lá só para defender o agronegócio, ou gênero, essas coisas… Acho que um senador, na Câmara Alta, tem que estar preparado para todos os temas, principalmente aqueles que venham a trazer uma melhor qualidade de vida para a população. Eu não quero ser deputado de bancada. Claro: tem orientação partidária? É assim que funciona? Sim. Mas eu não quero ser Centrão, bancada ruralista, bancada evangélica… Acho que essa divisão no Legislativo é injusta. E os segmentos que não têm bancada lá? Por exemplo, lá não tem a bancada das domésticas. Lá não tem a bancada dos motoboys. Mas tem a do agronegócio, tem a dos evangélicos… O Estado é laico. Como é que vai ter uma bancada evangélica onde o Estado é laico?

É particularmente interessante ouvir o senhor dizer isso, por causa do seu partido, o Republicanos, que tem uma ligação muito forte com o segmento evangélico e vem da Igreja Universal do Reino de Deus. Em se elegendo senador, o senhor não vai participar dessa bancada evangélica?

Não, eu não participo da bancada evangélica. No nosso partido, tanto na chapa estadual como na federal, temos pastores candidatos. Eu não sou contra. Acho que todos os segmentos devem participar. Mas eu não vou agir nessa linha. Não é todo republicano que é evangélico. Talvez o partido tenha sido fundado no Rio de Janeiro lá, não sei o quê e tal, mas eu não vejo como um partido evangélico. Parto do princípio de que o Estado é laico. Como é que vou participar de uma bancada religiosa? Eu sou contra essas nominações, sabe? A função de todos lá é a mesma: representar o povo brasileiro, não importa se ele é católico, se é crente, se é ateu ou não.

Pessoalmente, o senhor segue alguma religião?

Eu sou cristão. Fui criado dentro da Igreja Católica. Mas eu me refiro como cristão. E essas bancadas também são uma coisa que mexem com minha religião, porque, por exemplo, “bancada evangélica”: está dividindo o cristianismo. Hoje acho que temos mais de mil religiões no país. Isso só divide o cristianismo. Eu sou um cristão que fui criado dentro da igreja católica e sigo a doutrina cristã.

Mas o senhor espera obter votos dos eleitores evangélicos também, principalmente aqueles de denominações neopentecostais?

Sim. Eu os respeito como cidadãos. Por exemplo, quando fui prefeito, uma das maiores parcerias que tive, de mutirões, foi com a Igreja Adventista. Eu tratava como um segmento que estava colaborando. Também tive trabalhos com a Igreja Católica e com a Igreja Batista. Eu não tenho divisão.

Então o senhor fará uma campanha acima de religiões e, se eleito, não vai representar no Senado o segmento A, o setor B, a igreja C…

Exato. Mas sempre dentro dos meus princípios cristãos. Eu não nego que sou católico. Então, na minha campanha, não vou ficar invocando o nome de Deus em vão para dar uma de bonzinho. E, ao chegar lá, também não vou ficar defendendo uma teoria de um segmento religioso por isso ou por aquilo. O Estado nosso é bem claro: nós somos laicos. Então, lá dentro, somos todos iguais. Agora, a gente sabe que o Brasil é um país de predominância cristã.

O senhor foi vereador por quatro mandatos em Colatina e prefeito da cidade por um mandato, de 2017 a 2020. Foram duas décadas exercendo mandatos eletivos, mas sempre em Colatina, que não está mais entre os maiores municípios do Espírito Santo. E a campanha para o Senado é majoritária, você precisa obter votos de capixabas pelo Estado inteiro. O que o senhor pretende fazer para se tornar mais conhecido e obter votos de eleitores de outras regiões, principalmente os da Grande Vitória?

Vou fazer a campanha que sempre fiz. Vou usar os recursos que tenho, sem me vender. Em 2016 eu já usei muito a internet e continuo usando. A internet acabou com essa distância. De Colatina mesmo, posso fazer uma live, como já fiz, com os alunos de uma faculdade de Cachoeiro de Itapemirim. São 78 municípios. Pretendo ir em todos, como já tenho ido em alguns. Usar meu horário de televisão. E, sempre que eu puder, andar bastante, porque gosto de fazer campanha na rua, nas feiras, nos pontos de ônibus, dentro dos ônibus, onde as pessoas estão. Independentemente do resultado, a campanha já é uma grande vitória para o ser humano, porque você aprende muito como gente. Então, para mim, é uma coisa prazerosa. Pretendo ter um carro de som para anunciar meu número e meu jingle na cidade onde eu estiver. Nada mais. Será uma campanha bem econômica.

O senhor mencionou a importância da internet na sua atual campanha. Expandindo isso para os últimos anos, foi de fato uma ferramenta-chave para gerar o crescimento da sua popularidade muito além das divisas do Espírito Santo.

Através das redes sociais, o senhor se tornou muito conhecido país afora, especialmente em grupos muito identificados com o presidente Jair Bolsonaro. Confesso que é algo que me intriga: a que exatamente o senhor atribui essa identificação dos eleitores bolsonaristas com a sua figura?

Olha, eu não sei por quê… Não sei se foi a visita… No fim do meu mandato [de prefeito, em 2020], fui surpreendido com um convite do presidente da República. E, antes de o presidente ser eleito [em 2018], eu já tinha estado com ele e nós gravamos um vídeo. Colatina é uma cidade que eu sempre senti que teve um lado mais de direita e tudo. Agora, eu não sei, sinceramente, o motivo… Até porque nunca fiz campanha abertamente assim… Eu corro dessa bola dividida de esquerda e de direita, sabe? Acho que isso está antidemocrático. Do jeito que ambas as partes estão se comportando, a política está retroagindo. Ambos os lados defendem a liberdade de expressão, mas, quando você usa a liberdade de expressão, é malhado como um Judas na internet.

Já vivi isso na pele também. Mas, sobre o aumento da popularidade, acho que tem a ver com a internet. Hoje, se paro num posto de gasolina em qualquer parte do país, sou reconhecido pelo frentista. Nos aeroportos, também percebo isso.

Mas por que isso, prefeito? O senhor acha que pode ter a ver com o fato de as pessoas o enxergarem como um outsider político? Talvez uma percepção que as pessoas têm de que, apesar de ter sido vereador e prefeito, o senhor não é um político tradicional?

É, é isso. O mal do político brasileiro é ele ser um na campanha e outro depois, esquecer seu DNA. O primeiro vídeo meu que viralizou foi num sábado de manhã, a prefeitura estava fechada, eu vi um canteiro que estava horrível, fui lá e fiz o serviço. As pessoas não acreditavam que um prefeito, tido como autoridade máxima, pudesse fazer isso. Quando o gari ia lavar a rua, eu ia com ele. Quando a assistente social ia fazer um trabalho nas comunidades, eu ia junto. Então eu mostrei que era mais um funcionário público nomeado pelo povo do que uma autoridade. Por isso sempre fiz questão de dizer que eu não era prefeito, mas estava prefeito. Também não quero ser senador. Quero estar senador. Acho que o que explica minha popularidade é que as pessoas comuns se identificam muito comigo porque não sou aquele político “almofadinha”.

Tornando ao ponto anterior: muitos eleitores bolsonaristas se sentem identificados com o senhor? E o senhor se sente identificado com o presidente Bolsonaro?

Em parte, sim; em parte, não. Eu não sou um político que o líder faz tudo, eu vou lá e me identifico. Eu sou um crítico. Então tem coisas que eu concordo com Bolsonaro como tem coisas que eu não concordo.

O senhor pode me dar alguns exemplos?

Não sei se seria a hora da polêmica agora porque estamos numa pré-candidatura. Mas, por exemplo, concordo com ele quando ele quer realmente fazer economia, quando ele quer desburocratizar, acabar com certos mimimis. Agora, tem coisas que eu não concordo. Por exemplo, acho que a política ambiental deixa muito a desejar.

Tornando ao ponto anterior: muitos eleitores bolsonaristas se sentem identificados com o senhor? E o senhor se sente identificado com o presidente Bolsonaro?

Em parte, sim; em parte, não. Eu não sou um político que o líder faz tudo, eu vou lá e me identifico. Eu sou um crítico. Então tem coisas que eu concordo com Bolsonaro como tem coisas que eu não concordo.

O senhor pode me dar alguns exemplos?

Não sei se seria a hora da polêmica agora porque estamos numa pré-candidatura. Mas, por exemplo, concordo com ele quando ele quer realmente fazer economia, quando ele quer desburocratizar, acabar com certos mimimis. Agora, tem coisas que eu não concordo. Por exemplo, acho que a política ambiental deixa muito a desejar.

No primeiro ano da pandemia, em 2020, quando nem sequer tínhamos vacinas e o isolamento social era mais importante que nunca, o senhor fez questionamentos sobre a maneira como o governo Bolsonaro se comportou em face à crise sanitária…

Na pandemia, não segui a orientação do governo Bolsonaro. Seguei a orientação da ciência. Fui firme e forte. E bati de frente com bolsonaristas doentes na cidade, comerciantes… Mas segui tudo dentro do que a ciência orientava. Subi no trio elétrico pedindo às pessoas que fechassem, que respeitassem. Fui para a rua fazer isso. Respeitei os decretos que vinham de cima.

O senhor não se arrepende de ter agido assim?

Não, não me arrependo, porque acho que a gente fez o certo. E, se não tivéssemos feito o certo naquele momento, a situação hoje estaria pior. E ainda não estamos seguros. Você vê que, só nos primeiros dez dias de junho, já tem mais casos de infecção por Covid-19 no Espírito Santo do que no mês todo de maio. Pandemia não é uma questão de política. É uma questão de ciência. Fui um dos maiores incentivadores e até hoje incentivo a vacina. Então, me envolvi como cidadão e, como prefeito, fiz aquilo que achava que deveria ser feito, como a maioria do mundo fez: segui a ciência.

Para encerrarmos o capítulo Bolsonaro, o senhor se considera um bolsonarista?

Não. Eu me considero um brasileiro. Não me considero um getulista nem um seguidor de Moacyr Dalla, com quem tive uma ligação afetiva. Eu me considero um Sérgio Meneguelli, que tem uma personalidade política própria.

E como eleitor? O senhor vai votar em Bolsonaro para presidente da República?

Eu vou seguir a orientação do meu partido.

Que vai seguir com Bolsonaro, no caso. Se o Republicanos confirmar esse posicionamento, o senhor o seguirá?

Se for isso, tem que ser, porque seria até uma incoerência eu ser candidato por um partido e não estar sendo fiel àquele partido naquele momento.

O Republicanos é um partido de índole conservadora. Inclusive, em seu slogan, o partido se anuncia como o mais conservador do Brasil. O senhor também se vê assim?

Eu não tenho nada de conservador. Se pode existir, eu sou um conservador super liberal.

Não sei se existe, mas me explique esse conceito, por gentileza.

Por exemplo, em termos de costumes: eu gosto de conservar os bons costumes, mas dentro da modernidade, com avanço, com liberdade. Toda pessoa conservadora demais passa a ser radical. E uma pessoa radical é igual a um burro: tem aquela viseira, só vê o que está na frente, não vê de lado. E você sendo um conservador, conservando aquilo que há de bom, aqueles princípios que te fazem ser um cidadão melhor, mas ao mesmo tempo tendo a cabeça aberta… Então eu acho que sou um conservador moderno: conservo o bom, mas estou com a cabeça pronta para receber o novo.

O senhor se considera um “conservador” no sentido da “conservação” dos “bons costumes” e dos bons princípios. E em que exatamente considera-se um “liberal”? Pode me dar alguns exemplos na área comportamental?

No jeito de ver a vida, de entender, da convivência, de respeitar o próximo, a empatia… Sou uma pessoa que usa muito a palavra “empatia”. Acho que, sendo uma pessoa liberal, você tem a essência da empatia dentro de você.

O que é ser liberal?

É aceitar outras opiniões, é aceitar outras coisas, é aceitar o novo.

Aceitar as diferenças também, prefeito, inclusive de orientação sexual, identidade sexual e preferências sexuais?

Olha, nós vivemos numa país que é misturado. A gente tem que conviver. Por exemplo, na Bahia tem uma igreja católica e do lado tem um candomblé. Aqui você vê judeu conversando com muçulmano no meio da rua. Então por que você vai ser diferente? Se o povo brasileiro tem essa felicidade de aceitar as pessoas como elas são, sabe… Eu sou bem Rio de Janeiro em se tratando de Brasil. Eu acho o carioca mais democrático. Eu sou assim.

“Mais democrático” no sentido de ser menos preconceituoso, de aceitar as pessoas como são e as diferenças de comportamento?

É, tudo isso. Porque o preconceito, Vitor, o próprio prefixo já indica: você tem um pré-conhecimento, mas você não conhece.

O senhor me deu uma ótima deixa. É muito curioso que tenha destacado exatamente o povo carioca e o Rio de Janeiro. Seu ponto de vista, por mais louvável que seja, não vai exatamente ao encontro da visão do Republicanos. Por exemplo, há bem poucos anos, quando o senhor governava Colatina, o então prefeito do Rio, Marcelo Crivella, que condena a homossexualidade, chegou ao cúmulo de tentar confiscar uma revista em quadrinhos pelo simples fato de ela mostrar um beijo gay. O senhor se considera diferente da visão do seu próprio partido nesse sentido?

Em muitas coisas, sim. Eu acho que o Crivella foi mais um pastor do que um prefeito. Então não, eu vou ser prefeito, vou ser político. Eu não vou ter mandato com religião.

Quero trazer para a conversa uma especulação que está intensa e crescente no mundo político capixaba, que é sobre uma possível fusão das chapas majoritárias do PL e do Republicanos. Nesse caso, seriam removidas as candidaturas do senhor ao Senado pelo Republicanos e de Manato ao governo pelo PL, em favor das candidaturas de Magno Malta ao Senado pelo PL e de Erick Musso ao governo pelo Republicanos. O senhor acredita que isso seja possível?

Ah, isso é ilusão de adversários fracos que tentam plantar isso para desestabilizar. Nós estamos firmes e fortes. E não tem isso. Eu vou ser candidato a senador. Eu não abro mão. Eu não aceitaria esse jogo de combinar quem vai ganhar, quem vai perder. Cada um apresenta a sua chapa. Por que eu abriria mão para dar oportunidade a um baiano que já foi senador deste Estado por 16 anos? Por que um capixaba abriria mão disso? Não sou seguidor do Manato, mas, na convicção dele, ele é candidato ao governo. Por que ele vai abrir mão em benefício de outra pessoa? Isso é ilusão de adversários fracos. Plantaram isso na véspera de uma pesquisa.

Quem está plantando?

Isso me faz lembrar aquele filme de 1963*, da Marilyn Monroe: “O Inimigo Mora ao Lado”.

“O Pecado Mora ao Lado”.

É, o pecado…

Que pelo jeito não é tão diferente, nesse caso…

No meu caso, o inimigo mora ao lado. E eu não vou ser tão leviano. Esse é um assunto que não foi discutido no nosso partido. Eu tenho um vídeo gravado com o vice-presidente da República [Hamilton Mourão, recém-filiado ao Republicanos], que vai disputar o Senado pelo Rio Grande do Sul. O Marcos Pereira, presidente nacional do meu partido, me deu a palavra dele. Isso não passa de especulação.

A legenda está garantida ao senhor pelo próprio Marcos Pereira? O senhor acredita na palavra dele.

Acredito, assim como na do Erick e do pessoal aqui. O partido Republicanos só não vai ter candidato a senador se Deus não quiser. Porque, de resto, nada vai impedir a democracia, e nós não vamos abrir mão. Seria uma aberração, seria mostrar já a velha política antes de começar uma eleição. Por que essa preferência por quem já teve oportunidade? Eu não votaria nele. Se eu não fosse candidato, o meu candidato a senador seria outro.

O senhor não votaria no Magno?

Não, não voto. Ele já teve a oportunidade dele.

O senhor já votou nele no passado?

Não, não que eu me lembre. Já fui do partido dele há muito tempo. Tenho um pensamento diferente do Magno Malta e um modo diferente de fazer política

Diferente em quê? O senhor pode comparar os perfis?

Olha, eu não o conheço intimamente. Eu o conheço de mídia e já estive com ele em encontros políticos. Mas, pelo que vejo na mídia, primeiro que eu não fico atrás de mitos. Por exemplo, na última eleição do presidente Lula, ele foi o primeiro a aparecer ao lado do Lula na televisão. Depois, foi da presidente Dilma. Depois, foi do Bolsonaro. Será que, se o Bolsonaro for perder, ele vai pular e aparecer do lado do Lula? Acho ele muito populista. Como político, é um excelente pagodeiro, um excelente pregador.

E os eleitorados de vocês? Também têm perfis diferentes?

Ah, eu acredito que sim, pelo que vejo nas pessoas com quem convivo no dia a dia. Eu vejo que é um perfil diferente. E ele está nadando na onda de Bolsonaro, de extremistas, que é uma onda que é uma opção dele. É como ele se sente para ter um lugar na política. Eu respeito, mas acho que vou ser um senador muito diferente dele em Brasília.

Estou perguntando isso porque, como os dois estão em partidos bolsonaristas e que apoiam a reeleição do atual presidente, pelo menos em tese vocês poderiam disputar os mesmos eleitores, atrapalhar um ao outro e morrer abraçados na praia. Não existe esse risco?

Mas isso é democrático. Vamos supor que você concorde comigo e com ele. Você vai ver qual dos dois é melhor ou menos pior. Não vejo problema em haver mais de um candidato por partidos que apoiam o Bolsonaro. Por exemplo, eu ainda não sei quantos candidatos a senador aqui no Estado vão apoiar o Lula, mas tenho certeza que não vai ser um só. Então não estou preocupado com isso. Estou disputando um cargo legislativo. É claro que vou participar da eleição para presidente, mas como cidadão. Na eleição passada, para você ter uma ideia, votei no Alckmin no 1º turno. Só no 2º votei no Bolsonaro.

Se for eleito senador, o senhor provavelmente terá que se posicionar e votar sobre temas polêmicos relacionados à agenda de costumes. Legalização da maconha no país: o senhor é contra ou a favor?

Já está legalizada, não?

Não… Na verdade, não.

Quando se fala da legalização da maconha ou do aborto ou de qualquer outra coisa, tem que haver debate, tem que se ver a forma como é. Por exemplo, nos Estados Unidos, no estado de Massachussetts, a maconha é liberada. Mas não é liberada de qualquer maneira. Tem que se ver a forma como a proposta é colocada na mesa. Pode ser liberada de uma forma que seja prejudicial, mas pode ser liberada de uma forma que pode até trazer divisas. É como a discussão sobre jogos de azar no país: tem que se ver como é a maneira. As pessoas têm mania de colocar “ou oito ou oitenta”: ou você fuma maconha ou você é contra. Ora, você pode não fumar e não gostar, mas aceitar e não ver mal nenhum. Tem pessoas que veem o cara como um “maconheiro” não é nem pelo fato de ele fumar maconha: “Ah, é um maconheiro!” É como se fosse um marginal, um vagabundo. Hoje essa palavra está sendo substituída por “comunista”. Hoje, quando se fala que a pessoa é “comunista”, não é porque a pessoa tem uma ideologia política. O cara da direita fala “Aquilo é um comunista!”, como o cara da esquerda fala “Aquilo é um fascista!” Então é a forma radical como são colocadas as coisas. Mas é um tema que eu quero participar. Todos os temas polêmicos que envolvem a saúde da população a gente tem que colocar em primeiro lugar.

Falando nisso, o aborto, na sua opinião, deve ou não deve ser legalizado para além das três exceções já permitidas?

Como cristão, eu jamais cometeria um aborto, apesar de achar que o aborto é uma questão mais para as mulheres discutirem. O homem às vezes tem filhos abortados e nem sabe disso. Agora, a mulher sabe quando aborta um filho. Como cristão, sou contra ceifar qualquer tipo de vida. E o feto é vida.

Para terminarmos: união civil homoafetiva, o popular “casamento gay”, o senhor é a favor ou contra?

Vou te responder com uma frase que o Caetano canta: “Cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é”. Se a pessoa for feliz naquele casamento, que ela seja feliz. Não tenho que opinar sobre como aquela pessoa quer viver.

E esse casal deve ter direitos reconhecidos pela Justiça, como casal?

Direitos reconhecidos acho que qualquer sociedade deve ter. Às vezes você divide uma casa com uma pessoa do mesmo sexo. Mesmo que você não tenha relação afetiva com aquela pessoa, vocês estão dividindo um mesmo espaço, então têm que ter os mesmos direitos. Cada um tem o direito de ser o que quer ser. Isso para mim é uma coisa tão assim… Eu não sei nem por que se entra nesses debates, porque a própria sociedade vai conquistando isso. Antigamente falar em desquite era como falar hoje em aborto. E hoje se fala em divórcio como a coisa mais normal. Em 1977, no governo Geisel, rejeitou-se a lei do divórcio porque a Tradicional Família Mineira fez aquele movimento lá no Senado. Um ano depois, aqueles mesmos congressistas criaram o divórcio no Brasil. Então acho que é o momento e a maneira como a questão é discutida.

* “O Pecado Mora ao Lado”, clássico de Billy Wilder, na verdade foi lançado em 1955. Marylin Monroe morreu em 1962, de overdose.

 

Fonte: ES360